Para as mães do banco, com carinho

O que eu aprendi quando eu vi meu filho jogar um ano inteiro no banco

Flavia Cabral

6/23/20255 min read

Esse é o maior campeonato em número de participantes, com o T-ball e o Pré-Infantil e o Softbol jogando no mesmo lugar e ao mesmo tempo. Naquela época, eu — totalmente leiga e maravilhada com o esporte — assistia aos meninos de 9 e 10 anos como quem vê um espetáculo do Cirque du Soleil: “Meu Deus, olha como eles jogam com arremessador, com catcher, sem precisar do T… rebatem, correm, matam meninos na base… ágeis como acrobatas…”

Na minha cabeça, aquilo era outro mundo. Um mundo impossível pro meu filho alcançar quando tivesse 9 anos. Eu realmente achava que não daria tempo, que era difícil demais, que aquilo era só pra alguns.

Mas o destino (e a falta de atletas de 2013/2014) tinha outros planos. O time de Atibaia do pré-infantil (9–10 anos) precisava completar o elenco e acabou puxando quatro meninos que completavam 8 anos em 2023: Nico, Yago, Bernardo e Vinícius. Os outros três já tinham mais experiência, já estavam há alguns anos no beisebol.

O Nico… ainda não.

Os técnicos diziam que ele tinha potencial, força e tamanho. Mas eu via que ele ainda não tinha o tempo de beisebol, o conhecimento de jogo, a maturidade necessária e nem o gosto pelo treino. Enquanto os amigos viraram titulares, Nico era banco. Entrava só de vez em quando — primeiro como Jardineiro Direito e, depois, no segundo semestre, como Primeira Base. Jogava dez minutos aqui, um inning ali, ficava como último ou penúltimo rebatedor do line-up. Chegamos a viajar dez horas de ônibus pra ele jogar o finalzinho de um jogo já perdido.

Nicola Cabral, na época #6 no T-bol do Sofbol, no seu primeiro jogo
no Acrilex (2022) contra Tozan

E mesmo assim, eu o levava. Porque ele queria estar com o time. Queria brincar no alojamento, correr pelos corredores, jogar futebol depois da partida. E eu pensava:

“Pelo menos ele não está na tela, como a maioria das crianças de hoje. Ele tá vivendo algo do mundo real, pulando, correndo.”

Mas, confesso… doía. Eu reclamava com meu marido:

“Não vou mais levá-lo. Ele quase não joga. Por que o técnico não avisa logo quem vai entrar? A gente nem vinha.”

Só que ele queria ir. E voltava quase sempre arrasado. Chorava no carro. Dizia que queria desistir, que era injusto. Que vinha treinando muito, quase nunca faltava e merecia estar no line-up.

E eu… também não entendia o quão difícil é esse jogo e que, mesmo com meses de treino, ele não evoluia a ponto de estar pronto para ser titular. E ele continuava no banco. É duro ver seu filho ali e não querer invadir o campo e pedir:

“Dá uma chance, só pra ele mostrar que consegue.”

Mas a gente esquece que o mesmo técnico que escala… é o que treina. Ele sabe quem está pronto e quem ainda não chegou lá.

E o banco… fez o trabalho dele. Foi ali que o Nico começou a observar. A escutar (às vezes). A segurar o choro (quase nunca). Mas, principalmente, foi ali que ele começou a entender que ninguém ia dar nada para ele de presente. Que, pra jogar, ele precisava merecer. E que, pra merecer… ele precisava treinar sério.

E eu aprendi que ser reserva não é castigo. É processo. É degrau. Na época eu não via isso. Só via meu filho triste e achava que ele era injustiçado. Hoje, entendo que aquele banco ensinou mais do que qualquer prêmio.

A virada veio no ano seguinte, em 2024 — o primeiro ano de verdade do Nico na categoria que lhe era de direito. Em um dos campeonatos, Nico achava que tinha arrebentado de jogar e tinha mesmo. Rebateu bem, defendeu bem. Mas o troféu destaque foi pra outros meninos. Ele saiu quieto. Não gritou. Chorou baixinho e sozinho.

O Sensei percebeu e o chamou pra conversar. E eu nunca soube o que foi dito. Mas, desde aquele dia, o Nico virou outro. Passou a chegar no treino focado. Parou de dar desculpas. Ficou mais centrado e sério. Começou a querer aprender. A ver jogos da MLB, observar o posicionamento dos jogadores profissionais. Estudou as posições e jogadas. E eu vi ele se apaixonar de verdade pelo esporte. O bichinho do beisebol realmente mordeu.

E ele foi seguindo assim: treinando muito. Observando muito.

Hoje, aos 10 anos, ele é um dos titulares do time e, quem o vê jogar, acha que ele brilha por um talento nato. Mas foi o banco que construiu isso. Foi o banco que ensinou que quem quer… espera. Treina. Persevera. O banco ensina a ter casca. A segurar o orgulho. A perder… e continuar.

Ainda assim, essa posição não é garantida. Atleta tem fases de ápice e de baixa. O line-up muda conforme a dança. Além disso, no fim deste ano, os nascidos em 2015 mudam de categoria e de treinador (o ciclo vira de dois em dois anos). E quando ele subir de novo… pode voltar pro banco. Vai ter que se provar de novo. Treinar com a bola nova, a arremessar e rebater com efeito, aprender as novas regras que não tem no prézinho e trabalhar mais. Vai ter que conquistar, outra vez, cada espaço e posição. Porque no beisebol, como na vida, ninguém tem lugar cativo.

Por isso, se eu puder falar com alguma mãe de um menino que está no banco: não deixa esse momento decidir se ele vai continuar ou não no esporte.

Pra quem acabou de chegar no esporte competitivo, vindo das bases lúdicas, o banco parece triste. Mas é lugar de formação. Ser titular não significa estar no topo. Significa estar pronto e isso leva tempo de treino e maturidade de jogo.

Na maioria das vezes, os titulares são os meninos mais velhos da categoria, ou os que jogam há mais tempo e têm mais leitura de jogo. Não é sobre brilho rápido. Nem sobre talento escondido. É sobre trajetória. E o banco faz parte do caminho.

Segura esse tempo. Apoia. Incentiva. A vez do seu filho vai chegar. E quando ela chegar, você vai olhar pra trás e entender: o banco não é o fim. É só o começo.

Neste fim de semana, três anos depois daquele primeiro campeonato, o Nico volta para participar do seu último Acrilex. Agora como titular de Atibaia e jogando daquele jeito que achei que nunca jogaria. E com a mesma consciência de sempre: Nada é garantido. Tudo é conquistado. Bora lá?

Nico, de Jardineiro direito, durante um campeonato em 2023 no Cooper Clube

Essa era a visão que a gente mais tinha do Nico, durante o primeiro ano do pré-infantil

Eu lembro direitinho do primeiro campeonato do Nico no beisebol, apenas duas semanas depois que ele entrou no time, em junho de 2022. Ele tinha 7 anos. Era um Acrilex — o primeiro dele no T-ball, a categoria mais lúdica do beisebol (aquela em que as crianças aprendem mais a gostar da terra do que do jogo).

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